Tava ouvindo o disco novo do
Los Hermanos,
Ventura, na Rádio Uol (graças à
Nat, brigada). Eu já tinha ouvido a versão demo que vazou, com 13 músicas, mas pra falar a verdade nem ouvi muitas vezes. Então ainda não tenho uma opinião embasada o suficiente pra escrever uma resenha (em breve vai rolar lá na
BALA, feita por mim ou não), mas uma coisa eu já pude notar: como nos dois discos anteriores, minhas músicas preferidas são do Amarante. Não que eu não goste das do Marcelo, gosto também, mas é sempre uma do Amarante que me chama a atenção primeiro. A que bateu de cara (desde a demo) foi essa aqui:
Do sétimo andar
(los hermanos)
fiz aquele anúncio, ninguém viu
pus em quase todo lugar
a foto mais bonita que eu fiz
você olhando pra mim
alto aqui do sétimo andar
longe eu via você
e a luz desperdiçada de manhã
num copo de café
deus sabe, o que quis foi te proteger
do perigo maior que é você
eu sei que parece o que não se diz
o seu caso é o tempo passar
quem fala é o doutor
parece que foi ontem eu fiz
aquele chá de abu
pra te curar da tosse e do chulé
e pra te botar de pé
e foi difícil ter de te levar àquele lugar
como é que hoje se diz?
você não quis ficar
os poucos que viram você aqui
me disseram que mal você não faz
e se eu numa esquina qualquer te ver
será que você vai fugir?
se você for, eu vou correr
se for, eu vou...
Talvez tenha a ver com o que o próprio Amarante disse ao Pedro Alexandre Sanches, da Folha (numa matéria muito boa
linkada no
site da banda):
"Assumo que tento ser ficcional por inspiração do Camelo, que é minha maior influência. Mas quando tento acabo sendo autobiográfico".
É claro que não basta ser autobiográfico pra ser bom. E também é infinita a lista de autores não-autobiográficos maravilhosos. Mas talvez seja mais fácil "se entregar", "se dar" na hora de se expressar se você for autobiográfico. E como os dois compositores dos Hermanos são novos, e provavelmente ainda têm uma carreira longa pela frente...
Enfim, foi só um pensamento que me ocorreu quando li a matéria. E quando eu falo em ser autobiográfico, não quero dizer ser literal. Se isso fosse a mesma coisa, este blog aqui não faria o menor sentido – ou eu seria a mulher mais volúvel do mundo, hehehe. Por autobiográfico eu chamo o que um autor enxerga, não necessariamente o que ele vive. A forma dele apreender o mundo, o que está em volta.
Faz um tempo eu li uma crônica do João Ubaldo Ribeiro em que ele contava que tinha a mania de imaginar histórias pras pessoas que observava por aí (o ponto de partida era um casal conversando no bar: a menina, triste, João Ubaldo achando que o namorado estava terminando com ela; na verdade, era um cliente – ela era puta – que se recusava a pagar). Também tenho essa mania, acho que muita gente deve ter. E isso é um exemplo do que eu tô tentando dizer aqui.
O que eu faço o tempo todo é inventar histórias, claro. Mas vai ter sempre alguma coisa minha ali, sempre algum elemento que faça ou tenha feito parte da minha história. Uma frase, um comentário, sei lá. Um detalhe bobo que eu tenha observado em alguém ou algum lugar. Coisas do tipo. E as músicas do Amarante me passam isso. Mas, como na crônica do João Ubaldo, pode ser que essa minha história não tenha nada a ver com a realidade.