Chuva
O calor não me deixou dormir direito, e então eu resolvi sair na chuva. É, no Rio às vezes chove mas ainda faz calor. Me dei conta de que fazia muito tempo a última vez que eu tinha tomado um banho de chuva. Naquela época eu tinha medo de extraterrestres, de alguns sonhos e da morte, e ficava olhando pras nuvens e pensando no sentido de tudo, e tentando me reconhecer em mim mesma.
De lá pra cá, o medo da morte permaneceu e continua sendo algo que me angustia, mas pelo menos não tenho mais as nuvens grandes nem o céu tão estrelado pra me fazer pensar nisso. O medo de extraterrestres ficou adormecido em algum canto da mente. O medo dos sonhos ainda existe, mas agora não só quando eles são maus: quando eles são bons e parecem reais são muito mais cruéis. Acordar achando que a vida está melhor causa medos urgentes e angustiantes, principalmente nas noites quentes em que não consigo dormir.
Engraçado é que até a chuva me deu um certo medo. Mesmo pensando tudo bem, depois eu vou tomar um banho, demorei pra ficar à vontade. Pensei em tudo o que eu não consegui. E então me dei conta de que estava muito presa, que o medo da mudança não me deixava aproveitar o que estava por vir, ainda que fossem as gotas caindo sobre mim e a brisa refrescando, enquanto o cheiro de terra e grama molhada tomava conta do ar, me lembrando o tempo em que, ao contrário de agora, eu corria pra chuva.
Um dia eu também tive medo de te perder, e perdi. Achava que não conseguiria, mas tive que. Então vi que o medo de alguma coisa acontecer talvez seja muito pior do que o acontecimento em si. Eu te perdi antes da hora porque tive medo. Nunca mais quero ter medo de amar, nem de o amor acabar (ele sempre acaba), nem de me molhar. Não importa se fizer frio depois, fora ou dentro do meu coração. Eu vou correr de braços abertos.