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~ sábado, junho 01, 2002
 
Novamente você

Eu queria chorar mas não tenho motivo. Não perdi nenhum amor, nenhum amigo me traiu, nada. Nada: o pior que podia acontecer, como dizia o meu pai. Nada está acontecendo e isso me angustia porque eu sou uma pessoa que não gosta de ficar parada nunca. Quer dizer, eu tenho muita preguiça, detesto trabalhar por obrigação e às vezes gosto de ficar parada, mas o meu pensamento não pára nunca.
Talvez esse seja o problema. Acho que eu penso demais. E também sinto. E não sei dizer exatamente onde começa e termina o meu pensamento e o meu sentimento. Eu queria poder gostar de você, e eu gosto mesmo sem poder, mas não sei dizer se gosto, se admiro ou se são os dois, nem o que é que você tem que me parece tão diferente dos outros. Todos os outros. Você, que parece com tantos outros que eu já conheci, mas que ao mesmo tempo não parece nenhum deles. O que será isso? Será que eu estou te inventando?
Você tem ocupado tanto tempo do meu pensamento e não pode ocupar quase nenhum tempo da minha companhia. Eu sei que na verdade eu te conheço pouco e estive poucas vezes com você, mas eu sei também que o pouco pode ser muito se for intenso e isso eu acho que nós dois somos.
Eu não queria te comparar com ninguém, mas todos eles são tão medíocres, tão comuns — nem bons, nem maus, apenas comuns, o que pode ser pior que isso? — que perto deles você parece ainda melhor. Não que você não seja bom, mas perto deles você é maior.
Eu não tinha pensado em escrever sobre você. Era sobre o vazio. Era sobre o nada. Mas, como faz às vezes com o meu pensamento, você roubou o meu texto. E, mesmo não te tendo nem sabendo se eu vou ter, eu não quero te perder.

 

Lay-out por Davi Ferreira