Uma tarde
"Eu gosto de lugares assim, com esse ar europeu." Vista da varanda, a Rua do Rosário poderia tranqüilamente ser uma rua qualquer em Roma, Lisboa, Paris, alguma capital, ou até mesmo uma cidade não tão grande da Europa. As pessoas conversam, animadas, nas mesinhas, umas entre feijoadas e carne-de-sol, outras com seus capuccinos e financiers. "Eu também gostaria de viver um tempo na Europa. Na verdade, estudei em Barcelona por um ano e foi muito bom." Você também tem os dois pés no ar e brilho nos olhos. "Sabe, as pessoas falam que os franceses são arrogantes, mas, secretamente, eu gosto. Queria ser assim", você sorri, cúmplice. Nos divertimos com um amigo bêbado que chega à mesa e dou uma desculpa qualquer para sairmos dali. O centro do Rio num sábado à tarde parece ainda mais interessante. Às vezes é como se personagens antigos da história daquele lugar estivessem andando pelas ruas. No CCBB, a exposição é dura. A realidade congelada no tempo. Desisto da outra mostra. Seguimos em longos silêncios, pensativos. "Foi forte", você resume. "É", consigo dizer. No metrô, as palavras já não são mais tantas quanto antes. Mas o silêncio não é tão constrangedor assim, guarda uma certa intimidade. "Muito obrigado", você diz, antes que eu me despeça. Estou tão no ar que sigo na direção errada. Você desaparece no túnel. Eu espero o próximo capítulo.
Ele e todas as coincidências do mundo. Ele e há cinco anos eu não me sentia assim. Ele e tudo isso é um sonho, por favor, não me acorda. Ele e vou voltar em cinco anos. Para o batizado do meu filho, brinco. Ele e eu vou estar bêbado, tão bêbado no seu casamento. Ele e, pensando bem, não somos tão parecidos assim; existem outras pessoas com quem eu me conecto também e isso quer dizer que não era bem assim. Ele teve medo? Ele e os emails que me escrevia todas as semanas que se seguiram. Até que um dia ele parou, e eu já não me importava mais. Até que vi que estava enganada. Ele e a vontade que eu tenho de contar tudo na minha vida pra ele. Até que eu não esqueci d'ele.